sexta-feira, 29 de outubro de 2010

Sereno


O soluço do lago após o cair da brita,

A água emerge à margem sonolenta,

Súbito círculo aquático a se expandir,

Mas logo o lago será sóbrio e ledo novamente.



Enche-me de paz, quem contra mim grita.

Não me rouba o sossego, a turba violenta.

Quem quer me apequenar só me faz subir.

E logo lépido, lírico e límpido, seguirei em frente...



A brisa embala a folha morta num acalento...

O vento macio que canta sobre meu ouvido...

Tudo faz lembrar a serenidade da nascente...

Tudo tranquiliza, mesmo diante da serpente...

Não desequilibrar ante o logro do estampido...

Ter paz interior, ainda que haja um atroz tormento...



Nada me perturba, nem a turba turva. Nem a turba turva......




 

domingo, 19 de setembro de 2010

Balada do Pecado e da Redenção





O erro recorrente persegue
Corre, pula sobre mim,
Aproveita-se de minha fraqueza
E, soturno, suga-me o sangue


Essa parece ser uma fuga sem fim
Por mais que eu corra,
Por mais que eu fuja,
O erro vem atrás de mim,
Derruba-me,
Extirpa a seiva da vida
Satisfeito, levanta-se, espia-me


O pecado me vê levantar
Caminho cambaleante por átimos
Começo a caminhar com maior desenvoltura
O pecado sutilmente marcha em minha procura,
Sem nunca ter me perdido de vista


Ouço passos a seguir os meus
Apresso os passos, seus passos se apressam
Temeroso olho para trás. Quem será?
Faço sempre como se tivera dele me esquecido
Como se já não me acostumara a ser seu alvo


Eis que vejo a face funesta do erro
Ele me sorri sarcástico
"Sou eu novamente, velho amigo!"
"Vim provar teu pão com geleia"
Aí eu corro, aí eu corro, corro feito louco,
Louco e desesperadamente corro, e louco, corro
Eis que o pecado me insta:
"Fique aqui! Não há porque fugir!"
"Mais cedo ou mais tarde eu vou te atingir"
"Não adianta correr. Suas pernas se cansarão"
"Eis-me aqui, que nunca me canso de te seguir"
"Eis-me aqui, sua eterna, e terna, assombração"


Pede para que eu não sinta vergonha dele
Nem "de mim", nem "de nós, que somos um"
Por instantes me paraliso. Ele se aproxima.
"Eu te conheço", sorri, triunfante,
"Sempre voltas aos braços de teu erro"
"Ó, pequeno infante, sabes, não adianta resistir"
Sua língua ofídia se contorce entre os caninos
Delgados dedos. Delgados, pálidos e mortos...
Suas fúnebres falanges buscam meus ombros
Como as mãos da morte puxam dos escombros
A fugacidade dos prazeres mundanos, estoicos,
Resignados à "indelével" fraqueza humana,
À "inescapável" imperfeição do ser


Eis que, de súbito, cintila brilho novo em olho meu
Não irei me entregar à sordidez da sombra pecadora
Não darei ouvidos ao torpe vício que me persegue
A mentira é sua única arma, a ilusão é sua única isca
O erro quer me vencer pelo meu cansaço
Se eu me conformar com a desilusão, ele vencerá
E eis que a desilusão é a maior das ilusões
E eis que o conformismo é o mais terrível dos logros


--Afasta-se, infâmia! Não me curvarei à tua persuasão!
Irás se cansar, eu me livrarei de tua torpe perturbação
Não mais ouvirei teu veneno, tolo, pútrido e abjeto erro,
Tu és mero fantoche da morte, nada tens de sagaz
És um vulto obtuso, um parvo zumbi e não me assustas mais
Não é difícil viver sem ti, não és indispensável a ninguém
Saia daqui corado de vergonha e lembrando-se de quem,
Não sem motivos, renegou-te, solenemente, ao desterro!

domingo, 15 de agosto de 2010

Ninguém viu o que eu vi





"Evoquei as multidões que se agitaram e viveram nesses lugares: vi-as desfilar, diante do meu pensamento, com as paixões que as consumiram, com seus ódios, seus amores e suas ambições desvanecidas, com seus triunfos e reveses – fumaças dissipadas pelo sopro dos tempos. Vi os soberanos, chefes de impérios, tiranos ou heróis, cujos nomes foram celebrados pelos fastos da História, mas que o futuro esquecerá". (Léon Denis)¹

 
Ninguém viu o que eu vi...
Os que viram, não lembram mais;
Os que lembram, não estão aqui;


Ó, doce aurora das experiências!
Infância meiga, de paz e liberdade,
Teu alvo âmago da terna mocidade
É resquício de ignotas vivências!


Mesmo que só por intuição,
Vislumbro as ações do passado...
É o pretérito que se faz presente,
Mostrando-me o caminho andado


Quem eu era antes de ser quem sou?
Em minha antiga face, quem era eu?
Meus andrajos, quem os enterrou?
Meus olhos, quando a terra comeu?


E comeu.
E comeu...
E comeu...


Contemplei o espetáculo das revoluções
Vi o nascer e o morrer de cem gerações
Testemunhei a marcha dos belicistas,
A resistência dos pacifistas,
Ouvi o mutismo sepulcral...


Ninguém viu o que eu vi,
Os que viram, não lembram mais;
Os que lembram, não estão aqui;


Escutei um sábio falar de amor
Nosso mestre ensinava o perdão,
A caridade, ato prático da oração,
Congregava os espíritos fraternais


Mas nem tudo era belo e honesto...
Terríveis carnificinas na Antiguidade!
Mil corpos e uma legião de abutres...
E quantas estamentais iniquidades!


O sangue ungia o campo de batalha
E viúvas rezavam pelos seus mortos
A valentia usava uma rubra mortalha
Dos pós, renascíamos noutros corpos


Ah, mas como posso descrever se...
...Ninguém viu o que eu vi,
Os que viram, não lembram mais;
Os que lembram, não estão aqui?!


A repressão se camuflava de virtude
O honroso era taxado de "vergonha"
Pessoas mortas em fogueira medonha
Paradoxo da fé que assassina amiúde


Mas como ir ao Pai se não pela Paz?
Como fruir o Amor sem ter Fraternidade?
E como ser livre se não pela misericórdia?


Desejo a leveza do pólen,
Quero flutuar numa brisa,


Desejo o fulgor da chama,
Quero a rutilância ígnea,


Ser crepitação operativa!
Ser semente a semear!


Ainda não vi o que eles viram
O que eles viram, eu verei já


E verei.
E verei...
E verei...


Quando meu tempo chegar...


¹ Citação retirada da obra "Depois da Morte"

quarta-feira, 21 de julho de 2010

Acontece...


Rimei "amor" com "dor" no último post! Aaaaaahhhhhh!!!!!!
Qual é o sentido de "toda e qualquer"?
"Alegre canto" em oposição a "triste pranto"?
Ai, ai, ai...

domingo, 11 de julho de 2010

VERSOSuniVERSAIS


Que meu cantar, que o meu verso
Alivie as chagas de todo o universo,
Exaurindo do cosmo toda e qualquer dor,
Vertendo no mundo um caleidoscópio de amor!


Eu, cosmonauta das quimeras,
Eu, que sempre andei tão disperso,
Quero que se dispersem meus versos
Quais poeiras cósmicas, etéreas


Eu, surfista das musicais esferas,
Eu, viajante das vias sinuosas,
Solicito às estrelas e nebulosas
Que me deem livre passagem
Para que eu flutue pelo espaço,
Navegue pelo sutil, belo e vasto
Mundo sideral das luzes singelas


Pintor de remotas primaveras,
Tento espalhar meu alegre canto
Erguendo os caídos e infelizes
Secando-lhes o triste pranto
Com estrofes de ditosos matizes
Das mais risonhas aquarelas


Deslizo pelo universo infinito
Quão sublime, divino, bonito
É o espetáculo das constelações!


Voo pelas vastidões espaciais
Admiro que em toda a parte,
Em Andrômeda, Leão, Marte,
Haja as tonalidades celestiais


Óh, Grande Pintor do Universo,
Empreste-me tuas belas cores
Ensina-me, Senhor, a declamar
Para eu recitar nuanças d'amores
Aliviando os suplícios diversos
Pelos orbes por onde eu passar!

SITE SUGERIDO: http://hubblesite.org/gallery/album/entire/pr2010013a/ 

sábado, 26 de junho de 2010

Parábola da sala de estudos



Dentro de uma sala de estudos, colegas se esforçavam para aprender o conteúdo na véspera do teste. Um tinha mais facilidade com Geografia, outro só tirava dez nas provas de Matemática, um terceiro gostava de Biologia. Nenhum dos três, porém, conhecia a fundo as matérias dominadas pelos outros dois. E cada um tentava aprender e ensinar junto aos companheiros de estudo.
    Semelhante é a vida: cada qual possui aptidões das quais outros carecem. E mesmo o mais habilidoso tem muito a aprender.

sábado, 19 de junho de 2010

Sobre a natureza, as emoções e o dever



A natureza, qual livro aberto,
apresenta tantas belezas quanto as esconde
na dubiedade das interpretações passionais
Para o infeliz, a chuva é gélida e ultrajante
Para os namorados, uma refrescante festa
Se a noite aterroriza ou se a penumbra acalma
só saberei dizer se me disseres o que sentes
Assim é também o mundo humano...
...Somos bárbaros e pecadores?
Presunçosos e tolos?
Ímpios e irremediáveis?
Ou progredimos, mesmo que lentamente?
A alvorada chama-nos ao dever
A noite nos repara as energias
Ou vice-versa, talvez.
Mas dentro da natureza humana há uma estrela
Que nos instiga à reforma íntima
E nos convida ao progresso geral
Deixe chover! Deixe anoitecer!
Triste, não há porque se envergonhar!
Não há o que temer, podemos mudar...
...Todos somos estrelas, a alvorada é você!

sábado, 12 de junho de 2010

Pois ela é tooooooooooooda poesia!




Doce, afável e singela
Pois ela é toda poesia!
Delicada, resistente e bela
Pois ela é tooda poesia!
Linda, cheirosa e perfumada
Pois ela é toooda poesia!
Amiga, companheira e amada
Pois ela é tooooda poesia!
Inteligente, perspicaz e ativa
Pois ela é toooooda poesia!
Enigmática e contemplativa
Pois ela é tooooooda poesia!


Irmã da lua, filha da natureza
Estrela ardente de tenra beleza
Pois é, pois é, pois é, pois é, pois é...
...Pois ela é tooooooooooooda poesia!

sábado, 5 de junho de 2010

Borboleta


Ó, borboleta de asas extirpadas,
que foram arrancadas como se rasga papel!
Sofres, ofegante, caída na terra,
olhando para cima, ambicionando o céu
Não te demores, saudosista, a lamentar a sina
Problemas são vários, dores são muitas...
Cicatrizes lãnguidas e maiores que as tuas
são encontradas em qualquer esquina
Levante as antenas, acerte o prumo
Não és mais borboleta? Reinventa-te, lagarta!
Não há caminho? Abra uma trilha, siga seu rumo
Seja a mais sábia em Atenas, a mais forte em Esparta!

quarta-feira, 21 de abril de 2010

Parabéns, Brasília, pelos seus 50 anos!

...É hora de soprar as velinhas!
BRASÍLIA
Brasília, "emos" do Pátio Brasil
Tão solitários quanto companheiros são...
...Da solidão de seus próprios amigos
Brasília bipolar:
Numa hora faz sol
Brilhante
Noutra volta a nevar
Brasília moderna
A sinuosidade do teu traçado
É a beleza, assinatura de um mago
Brasília encontro
Confluência de todos os cantos
Gente de sorrisos e prantos
Misturam-se na imensidão Rodoviária
Brasília teto do mundo
Laranja celeste mais profundo
Do melancólico cair da tarde
Brasília pele que arde
Carne que queima sem alarde
Tens a pulsação serena...
...Da impetuosidade de um poema
Brasília sem esquinas
Grandes espaços desocupados
Brasília dos monumentos
Que amolecem em fragmentos
Brasília das pichações
Brasília das cigarras lamuriosas
Que choram, desgostosas,
O que o Brasil poderia ser, mas não é (ainda)

sábado, 20 de fevereiro de 2010

Complete o Conto

Terminava de mexer o café após adoçá-lo quando teve um pensamento repentino. Era um clarão que não iria abandonar sua mente até que o final de semana acabasse. "Claro!"--pensou ele.

Pegou o telefone e discou rapidamente para Ana. Dedilhava com angústia o fone do aparelho. Piiiimm, piiimm, piiimm...Ninguém atendia.

Após muito esperar, desligou o telefone. Pegou o seu velho livro de neoplastia hiperzoomórfica, abriu-o, soprou a poeira. Buscou no índice remissivo algo que pudesse explicar tamanho absurdo. Seu coelho crescera dois decímetros em dois dias.

Os dias de chuva, pensou, são os mais perigosos. Tudo ocorre sobre os olhos lunaticamente luminosos do tédio ganancioso. Subiu até o terceiro andar e pegou uma caixa que estava debaixo da cama. Era azul e pequena. Tinha um bilhete pregado sobre a tampa. Leu-o e, com remorso, amassou-o. Abriu vagarosa e cuidadosamente a caixa.

Estava ali, sob seus olhos, a causa de tamanha apreensão. Ignorando a consciência, seguiu em frente.